Longe vão os tempos em que a maioria dos alunos que estudavam Comunicação queriam ser jornalistas. Entre quem começa na profissão, ou quem já desistiu de tentar, há um diagnóstico comum: não é pelo dinheiro que o fazem. E mesmo recebendo pouco, não há lugar para todos

Não é novidade que o jornalismo enfrenta um período complicado, mas as dificuldades sentidas ganharam agora visibilidade renovada, com a crise no grupo Global Media. A ameaça do despedimento coletivo de até 200 jornalistas numa das maiores empresas portuguesas do setor tem feito os jovens jornalistas colocarem o futuro em perspetiva. Muitos confessam que seguir jornalismo é uma decisão feita com base na paixão pela área e um certo sentido de sacrifício, porque as condições há muito deixaram de ser aliciantes.

(…)

A atitude de um jovem licenciado também está muito constrangida pelas próprias necessidades do mercado e pela forma como o acesso à profissão está hoje desenhado”, refere Marisa Torres da Silva, professora do departamento de Ciências da Comunicação da Universidade Nova de Lisboa.

O acesso a uma vaga para jornalismo é, frequentemente, negado com o argumento de que é necessário experiência profissional. A docente universitária explica que há vários alunos que se sujeitam a “um processo de acumulação de trabalho gratuito” para adquirir essa tal experiência. O acesso à profissão fica vedado aos que “têm possibilidades para fazer estágios não remunerados de forma consecutiva, portanto, no fundo, o exercício da profissão acaba por ser uma situação de privilégio de classe”.

Este acumular de estágios não renumerados cria outro problema: a impossibilidade de aceder à carteira profissional, o título que permite ao jornalista assinar notícias em seu nome. Para pedir a creditação, o recém-licenciado precisa de realizar 12 meses de estágio profissional renumerado, ou 18 meses, caso o candidato não seja licenciado numa área da comunicação social.

(…)

A indecisão de Inês é comum a outros estudantes que ingressam em Ciências da Comunicação. Marisa Torres da Silva é professora universitária desde 2006, já formou gerações de futuros jornalistas tanto na Universidade Nova de Lisboa, onde ainda leciona, como na Universidade Lusófona, também na capital. Ao longo dos anos, observou uma mudança significativa na escolha de especialização do aluno que ingressa na licenciatura. “A porção mais significativa dos alunos que entram para Ciências da Comunicação, já não quer propriamente jornalismo”, revela. Agora esta especialização está em segundo lugar, ultrapassada pela comunicação estratégica.

Há “alunos que entram no curso com a ideia de seguir jornalismo, mas depois face também ao cenário que lhes é apresentado e face também à possibilidade obviamente legítima de obterem um emprego mais estável e financeiramente mais aliciante, optam por outras áreas”, diz.

Uma realidade também já notada pelo professor Luís António Santos, da Universidade do Minho. “Era comum ser a primeira opção para quase metade de uma turma, e uma turma tem 80 a 90 alunos, e jornalismo, neste momento, é opção para, talvez, um quarto da turma”, descreve. Embora note, em quem está nesta situação, um acrescido “espírito de missão” e uma “vontade grande” de trabalhar no jornalismo, o que não significa que “no passado, não existisse [essa motivação], mas as pessoas não eram postas de forma tão decisiva perante um aperto tão claro”.

Atualmente, existem 25 formações em ensino superior para aqueles que ambicionam obter uma licenciatura na área. Há oito cursos nas universidades públicas, o mesmo número que existe em privadas e no ensino politécnico, estando distribuídos por 13 dos 18 distritos de Portugal Continental. Nas ilhas, não existe formação nesta área.

(…)

Veja notícia na integra aqui: https://expresso.pt/geracao-e/2024-01-20-Mae-pai-desculpem-me-mas-desisti-do-jornalismo-precariedade-baixos-salarios-e-falta-de-oportunidades-afastam-jovens-da-profissao-287f8f81#comentarios